quarta-feira, março 09, 2005

Restaurante Chinês

Uma indica a mesa e entrega a ementa, outra aceita o pedido e há uma terceira que traz a bebida. O restaurante chinês, e eu a escrevê-las sem olhar para elas, tentando furtar-me à vigília que não me permite coçar o cocuruto ou dar um suspiro sem que uma venha a correr com a ementa.

E para além desta corte de servidoras “- quantos são? tlês?�, “-quele aloz chao-chao?� há vantagens em ir ao restaurante chinês? Há e várias. Uma televisão que se é inevitável não tem som e à qual me furto escondendo-me num canto da sala, a suave e diferente música que soa, cheia de tlin-tlins e outros requebros chineses no som que me fazem suspeitar ser uma modinha pimba daqueles lados, afinal condizente com o plástico da decoração kitch que todos os restaurantes chineses exibem. Mas é uma mudança audível que me agrada, o relativo sossego na sala que, exemplo, me permite estar a escrevê-la entre pratos.

Nos meus velhos e jovens tempos, porque a colónia chinesa em Moçambique era bem significativa e visível no pequeno comércio, era ainda novo quando fui iniciado nestas inovações gastronómicas, neste olhar à mesa e de garfo para uma cultura tão diferente da que fazia a rotina habitual, sendo que após ter ganho as asas da alforria financeira os restaurantes chineses eram bastantes frequentes no meu roteiro. Desde o velhinho que existia numa rua que desaguava na Praça Mac-Mahon, quase à esquina com a mesma e restaurante modesto com factura a condizer, até ao requintado da Av. António Enes onde nós, os trabalhadores administrativos do sindicato dos estivadores, fazíamos o nosso almoço mensal no dia do santo ordenado. E, como curiosidade, recordo-me de ter ido muito poucas vezes ao celebérrimo restaurante Macau, da baixa da cidade.

Houve um período e que durou mais de um mês no qual várias vezes à semana jantava no ‘chinês’ que estava na antiga cervejaria Ponto Final, numa esquina da Av. Pinheiro Chagas e a meio caminho entre o Alto Maé e a Polana. Na altura, já a viver sozinho há talvez um ano ou mais, almoçava diariamente na pastelaria dos meus pais, a Veneza no Malhangalene, e o jantar era ao sabor de impulsos, apetites que deixava crescerem enquanto a motorizada rolava aguçando vontades. Outras vezes improvisava um ovo estrelado e umas fatias fritas de corned beef enlatado, outras vezes esquecia-me de jantar e disso não me ralava. Mas fui comensal aplicado desse restaurante chinês pelos olhos amendoados da moça chinesa que me atendia e aos quais sorria, e dela e deles também alguns desses carinhos recebia.

Sempre fui ferrenho dos amores platónicos e com atracção pelo original, o gosto pelo toque exótico nas emoções é uma constante. Aqueles olhos, irónicos e divertidos, amigáveis e de bonitos traços orientais, atraíam-me sempre que as lecas me permitiam seguir o impulso que me conduzia à mesa do restaurante chinês, ao mar de sonhos exóticos que naqueles olhos teimava em sonhar e que intimamente me deliciavam. Não, não estava apaixonado desta vez. Tratava-se tão só dum curso intensivo de gastronomia oriental, servido por uma pitinha a cujos olhos dedicava suspiros entre a sopa wan-tan e o chau-min, ou era (mais) uma paixão secreta dum romântico precoce e ainda hoje inveterado? A tanto não chegou, mas imaginem o quão feliz me sentia quando a via manobrar entre as colegas para ser ela, sempre, quem me atendia…

Terminei. A refeição e o post. Houve uma que trouxe a banana pa-si (sou fã) e o café. Sei, - já sei…, que a conta será ainda outra a trazer-ma. Olho-as nos olhos e busco sinal daqueles outros que a memória das coisas bonitas invoca e não os vejo. Talvez porque já não há paixão nos meus, só saudade. Dum tempo em que acreditava num Éden que lia nuns olhos amendoados, perfeitos, um tempo em que não sentia vergonha por me apaixonar mas sim de o declarar.

Tenho é saudades de mim e da beleza dos amores platónicos, eis como termino o meu post escrito no restaurante chinês de Almeirim.

3 Comments:

Anonymous Anónimo said...

GIRO, este 'post'!! _ beijo, muf'

quinta-feira, março 10, 2005 11:23:00 da manhã  
Anonymous Anónimo said...

Eu também, sou-fã tua.Beijinhos.Elsa.

quinta-feira, março 10, 2005 2:07:00 da tarde  
Blogger th said...

Ai é??? não me deixaste entrar até agora...também agora não me apetece dizer nada, prontusssssss! AMUEI!

quinta-feira, março 10, 2005 11:58:00 da tarde  

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